ONU exige que Israel permita entrada de ajuda humanitária em Gaza

ONU exige que Israel permita entrada de ajuda humanitária em Gaza

O máximo órgão judicial da ONU exigiu, nesta sexta-feira (26), que Israel evite qualquer ato de genocídio em Gaza e permita a entrada de ajuda humanitária no território palestino, onde trava uma guerra contra o movimento islamista palestino Hamas desde outubro.


A Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, não se pronunciou sobre a questão subjacente de saber se as operações israelenses em Gaza se enquadram no conceito jurídico de genocídio, um debate que pode levar anos.


Mas considerou que a "catastrófica situação humanitária" no território palestino "poderia piorar ainda mais", antes de pronunciar sua decisão final, razão pela qual exigiu várias medidas de emergência.


Uma delas, para que Israel tome "medidas imediatas e eficazes para permitir a prestação de serviços básicos e de ajuda humanitária" em Gaza, onde 85% dos cerca de 2,4 milhões de habitantes se tornaram deslocados internos desde o início da guerra.


Também instou o país a fazer tudo o que puder para "impedir a prática de todos os atos dentro do âmbito de aplicação" da Convenção para a Prevenção do Genocídio e "impedir e punir" qualquer incitamento ao genocídio.


Antes de ler as disposições, a presidente do tribunal, Joan Donoghue, citou declarações de responsáveis israelenses, como o ministro da Defesa, Yoav Gallant, que ordenou um "cerco total" à Faixa de Gaza em 9 de outubro e disse então que as suas forças estavam "lutando contra animais".


O tribunal emitiu esta decisão no âmbito do recurso de emergência apresentado em dezembro pela África do Sul perante a CIJ, que argumentou que Israel violou a convenção da ONU, firmada em 1948, após o Holocausto.


Cessar-fogo


A chanceler sul-africana, Naledi Pandor, considerou que estas medidas equivalem à exigência de um cessar-fogo.


"Como prestar ajuda humanitária sem um cessar-fogo? Como fornecer água, [facilitar] o acesso à energia? Como garantir que os feridos sejam beneficiados com cuidados de saúde?", questionou ela em frente ao Palácio da Paz em Haia, onde está sediada a CIJ.


"Sem um cessar-fogo, não se pode fazer nada disso", acrescentou.


O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, observou que "a acusação de genocídio apresentada contra Israel não é apenas falsa, é escandalosa".


Durante dois dias de audiências realizadas este mês, Israel ressaltou que agiu em legítima defesa, após os ataques do movimento islamista palestino Hamas em 7 de outubro, em seu território, e que faz o que pode para proteger os civis de Gaza.


Entretanto, a CIJ afirmou que as medidas adotadas até o momento "são insuficientes" para proteger os direitos dos palestinos.


O Hamas, que governa a Faixa de Gaza, considerou a decisão um "avanço importante que contribui para isolar Israel e expor seus crimes em Gaza", segundo um comunicado. E a Autoridade Palestina viu a decisão como uma demonstração de que "nenhum Estado está acima da lei".


A guerra eclodiu em 7 de outubro com a incursão de comandos islamistas que mataram cerca de 1.140 pessoas, a maioria civis, e sequestraram cerca de 250 no sul de Israel, segundo um relatório da AFP baseado em dados oficiais israelenses.


As ações de retaliação, com bombardeios incessantes e ofensivas terrestres em Gaza, deixaram até agora pelo menos 26.083 mortos, a maioria mulheres, crianças e adolescentes, segundo o Ministério da Saúde do território.


"Preocupação" com os reféns


Israel afirma que, se houve atos de genocídio, estes foram perpetrados pelo Hamas na operação de comando de outubro.


Em comentários feitos à margem da decisão, a presidente do tribunal afirmou nesta sexta-feira que o tribunal está "muito preocupado" com a situação dos reféns em Gaza e exigiu a sua "libertação imediata e incondicional".


Pouco depois, o grupo islamista divulgou um vídeo no Telegram no qual aparecem três mulheres israelenses feitas reféns em Gaza. Duas delas, Daniella Gilboa e Karina Ariev, apresentam-se como recrutas do Exército israelense, e a terceira, Doron Steinbrecher, como civil. 


No fim de novembro, durante uma trégua de uma semana, os islamistas trocaram uma centena de reféns por prisioneiros palestinos em Israel. Atualmente, 104 pessoas permanecem cativas em Gaza, segundo dados israelenses, e 28 morreram.


Israel aceitará a decisão?


A questão agora é se Israel cumprirá ou não a decisão do tribunal.


A CIJ, que trata de litígios entre países, emite decisões vinculantes e que não cabem recurso, mas não dispõe de meios para garantir a sua aplicação, como quando ordenou à Rússia que parasse as suas operações na Ucrânia, sem sucesso.


No dia 14 de janeiro, Netanyahu manifestou a sua firmeza na manutenção da ofensiva. "Ninguém nos impedirá, nem Haia, nem o eixo do mal", declarou.


Em qualquer caso, os especialistas acreditam que, independentemente do impacto simbólico que a decisão possa ter, provavelmente haverá consequências tangíveis no terreno.


Segundo Juliette McIntyre, especialista em direito internacional da Universidade do Sul da Austrália, se a CIJ, como terceira parte neutra, determinar a existência de um risco de genocídio em Gaza, "será muito mais difícil para um país continuar apoiando Israel".


As nações que mais apoiaram o caso perante a CIJ foram aquelas de maioria muçulmana, incluindo Irã, Turquia, Jordânia, Paquistão, Bangladesh, Malásia e Maldivas. Na América Latina, Brasil, Colômbia, Bolívia e Venezuela corroboraram a iniciativa.


A União Europeia recordou que "as ordens da CIJ não são vinculativas" e disse esperar sua "implementação plena, imediata e efetiva".


O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, igualou a decisão do tribunal a um "triunfo da Humanidade" e sublinhou que "o que se impõe é um cessar-fogo para a libertação integral dos reféns de ambos os lados".


Já o presidente argentino, Javier Milei, condenou a violência "atroz e imperdoável" do Hamas e criticou o "ressurgimento do antissemitismo".


UNRWA demite funcionários


A Agência da ONU para os Refugiados Palestinos (UNRWA) informou nesta sexta-feira que demitiu "vários" funcionários acusados por Israel de estarem envolvidos no ataque de 7 de outubro.


"Qualquer funcionário que esteja envolvido em atos de terrorismo terá que prestar contas, inclusive mediante ações legais", declarou.


Pouco depois, os Estados Unidos anunciaram a suspensão temporária do financiamento desta agência enquanto analisava estas acusações. (AFP)

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