Uma investigação conduzida pela Controladoria-Geral da União (CGU) revelou um esquema milionário envolvendo a Confederação Brasileira dos Trabalhadores de Pesca e Aquicultura (CBPA), que movimentou R$ 221 milhões por meio de descontos em benefícios previdenciários. O que choca no caso é o fato de que toda essa arrecadação foi feita por uma entidade que, segundo a CGU, não possuía sequer um funcionário registrado. O presidente da Confederação, Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, comparece nesta segunda-feira (3) para prestar depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS. A Controladoria aponta que a organização carece de estrutura para representar o grande contingente de pescadores que alega ter como associados.

O relatório da CGU foi crucial para a abertura de um processo de responsabilização contra a CBPA, que é alvo da Polícia Federal (PF) na Operação Sem Desconto, que apura suspeitas de fraudes em descontos de benefícios do INSS. A entidade surpreendeu ao registrar um salto de zero associados em 2022, ano em que firmou o Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS, para mais de 340 mil pessoas em 2023, gerando uma arrecadação de R$ 57,8 milhões. No primeiro trimestre de 2024, o número de filiados saltou para 445 mil, totalizando R$ 41,2 milhões em faturamento no período. A CGU destacou um crescimento "vertiginoso" entre junho e julho de 2023, quando foram adicionados 187.547 descontos associativos, passando de 34.964 para 222.511.

A Controladoria suspeita que a CBPA possa ter recorrido a serviços de telemarketing para cooptar filiações, o que é expressamente proibido pelo ACT firmado com o INSS. Os dados logísticos levantam suspeitas: em um mês de 22 dias úteis e 8 horas diárias de trabalho, a Confederação teria adicionado mais de 8.500 descontos por dia útil, o que equivale a quase 18 por minuto. O documento enfatiza a ausência de estrutura operacional da CBPA para processar esse volume, notando a falta de registro de funcionários na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS). Além disso, a CGU identificou mais de 40 mil tentativas de inclusão de descontos em benefícios de pessoas que já haviam falecido, o que viola as obrigações do acordo com o INSS, que exige a imediata comunicação e devolução de valores em casos de óbito. O caso mais extremo citado é a tentativa de desconto de uma suposta filiada falecida sete anos antes da própria abertura da entidade.

O presidente da CBPA, Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, tem um histórico de atuação política, sendo ex-dirigente do Republicanos no Rio Grande do Norte e ex-candidato a deputado federal pelo mesmo partido em 2018. A Advocacia-Geral da União (AGU) obteve o bloqueio judicial dos bens de Abraão Lincoln e da Confederação, e a CPMI aprovou a quebra dos sigilos fiscais e bancários da entidade e de seu presidente. A Operação Sem Desconto da Polícia Federal, iniciada em abril de 2025, segue investigando fraudes nos descontos em benefícios de segurados do INSS por todo o Brasil.